Relembre os 100 primeiros dias de Collor, FHC, Lula e Dilma na Presidência
Jair Bolsonaro (PSL) completou nesta quarta-feira (10) cem dias de governo. Pesquisa Datafolha apontou que ele é o presidente em primeiro mandato com pior avaliação nos três primeiros meses desde a redemocratização, em 1985.
Relembre como foram os cem primeiros dias dos antecessores de Bolsonaro eleitos para a Presidência: Fernando Collor de Mello (PRN), Fernando Henrique Cardoso (PSDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Dilma Rousseff (PT).
Collor
Os cem primeiros dias de Fernando Collor de Mello na Presidência da República, de março a junho de 1990, foram marcados por recuos nas reformas econômica e administrativa que propunha.
Nesse período, a aprovação do presidente caiu pela metade. De acordo com pesquisa feita pelo Datafolha, Collor assumiu o cargo com apoio de 71% da população, que acreditava que seu governo seria bom ou ótimo. Após três meses de gestão, o índice foi a 36%.
A principal bandeira da gestão Collor era o controle da inflação, que chegou a atingir mais de 80% ao mês logo antes de o presidente assumir o governo. A equipe econômica conseguiu baixar esse índice para a casa dos 10% nos dois primeiros meses de governo, mas a duras penas.
O Datafolha apontou que a maioria (58%) da população se sentia mais prejudicada que beneficiada pelas medidas econômicas. A taxa de desemprego cresceu, aplicações financeiras foram retidas, preços e salários foram congelados.
O novo presidente também quis fazer uma reforma administrativa: em 9 de maio, impôs a seus ministros o corte de 360 mil funcionários públicos até 18 de junho. No dia 14 de junho, o governo abandonou a proposta. Até o final do prazo, apenas 8% da meta tinha sido cumprida.
Collor também ficou conhecido por suas ações publicitárias extravagantes: nos cem primeiros dias, já havia gasto Cr$ 4,8 milhões (R$ 419,2 mil, em valores corrigidos) em marketing, o que equivalia a seis anos e três meses do salário do presidente (Cr$ 65 mil na época, ou R$ 5.677).
Em uma das ações, visitou supermercados para conferir os preços e comprar itens da cesta básica. No passeio, gastou Cr$ 7.154,82 (R$ 624,92) –quase o dobro do salário mínimo vigente (Cr$ 3.674,06 em junho de 1990, ou R$ 320).
FHC
Medidas de austeridade marcaram os cem primeiros dias de Fernando Henrique Cardoso na Presidência da República, de janeiro a abril de 1995. Era o início do Plano Real, e o governo tentava balancear as contas e aprovar reformas necessárias para conter o déficit.
FHC assumiu a Presidência com aprovação de 70% da população. Após três meses de sua posse, o número caiu para 36% –a insatisfação era causada, principalmente, pelo veto ao aumento do salário mínimo.
O Congresso havia aprovado em janeiro uma mudança de R$ 80 (R$ 407,50 em valores corrigidos) para R$ 100 (R$ 509,37). A medida foi barrada no Executivo, que considerou que a variação seria irresponsável no cenário econômico da época.
O presidente sugeriu a diminuição do salário dos parlamentares como forma de mostrar à população que também seriam atingidos pela austeridade. Em março, chegou até a devolver parte de seu salário.
As ações não mudaram a opinião popular, que organizou protestos com milhares de participantes. Em comitiva no Recife, o ônibus do presidente foi atingido por ovos, pedras, pedaços de madeira e até chinelos. No mês seguinte, entraria em vigor o salário mínimo reajustado, de R$ 100.
Uma das medidas mais importantes nesse período inicial foi a sanção da Lei das Concessões, que permitia que a iniciativa privada atuasse em áreas que eram exclusivas do governo, como geração de energia elétrica e telecomunicações.
Uma peculiaridade dos primeiros meses do governo foi que o presidente fazia mais leis que o Legislativo: com 22 dias de governo, FHC havia editado 20 medidas provisórias –instrumento que tem força de lei, mas que não precisa passar por votação no Congresso e reservada apenas para casos urgentes. Com Fernando Henrique, havia MPs sobre os mais diversos assuntos, como vendas de carros populares, mensalidades escolares e regras orçamentárias.
Em março de 1995, o presidente se comprometeu a restringir as medidas a temas específicos em troca do apoio parlamentar para aprovar a reforma da Previdência. As medidas só seriam sancionadas em 1998, três anos depois.
Lula
A principal bandeira de Luiz Inácio Lula da Silva em seus primeiros cem dias de governo, de janeiro a abril de 2003, foi o combate à fome. O governo teve de fazer concessões ao mercado para poder investir em programas sociais, como o Fome Zero.
A época foi marcada pelo aumento nas tensões entre os EUA e o Iraque. O clima não afetou o otimismo do brasileiro: Lula foi empossado com 76% de aprovação e 48% da população acreditava que a situação econômica do país iria melhorar, de acordo com pesquisa do Datafolha.
Após três meses de governo, 43% avaliaram o governo como ótimo ou bom –até então, o maior nível aos cem dias desde que o Datafolha começou a fazer o levantamento, no governo Collor.
Logo no início do mandato, a agenda do presidente em janeiro causou controvérsia: entre os dias 23 e 28 de janeiro, seriam realizados o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, e um evento criado como seu contraponto, o Fórum Social Mundial, em Porto Alegre. O presidente havia participado do último nos dois anos anteriores. Decidiu “ir à Davos levar as ideias de Porto Alegre”, como definiram seus assessores.
Participou do primeiro dia do evento no Brasil e partiu para a Suíça, onde discursou sobre luta contra desigualdades. “Se existe uma razão para haver uma guerra, não é uma guerra entre os povos, mas a guerra dos países ricos para acabar com a fome no mundo”, disse. Foi apoiado pelo empresário suíço criador do Fórum, Klaus Schwab, e o ex-presidente americano Bill Clinton.
Durante o período, Lula começou a implementação do Fome Zero, sob duras críticas, tanto internas quanto da oposição, de que o programa seria paliativo e "fácil de burlar". O programa foi implementado em duas cidades-piloto no interior do Piauí: Guaribas e Acauã. No fim de fevereiro, são distribuídos os primeiros cartões-alimentação, que davam direito a R$ 50 mensais (R$ 124 em valores corrigidos) para compra de alimentos.
Nos primeiros cem dias, o governo também conseguiu aprovar um pacote de mudanças tributárias, em vitória de 442 a 13 no Congresso. Estavam incluídas a unificação do ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços, que antes tinha legislação diferente em cada estado) e a simplificação de imposto para a indústria.
Dilma
Os cem primeiros dias de Dilma Rousseff, de janeiro a abril de 2011, mostraram que a presidente tinha estilo diferente de seu antecessor, mas manteve o alto índice de aprovação.
Dilma assumiu após Lula encerrar seu mandato com a melhor avaliação da série histórica, considerado ótimo ou bom por 83% da população, segundo o Datafolha.
Após três meses de mandato, a primeira mulher presidente teve a melhor avaliação em relação aos antecessores no mesmo período: 47% consideravam sua atuação ótima ou boa, contra 39% de FHC e 43% de Lula.
De acordo com análise de especialistas, não houve transferência de popularidade de Lula para Dilma. “Lula não tem aparecido com Dilma, ela tem aparecido sozinha. Não é como na campanha, em que os dois apareciam juntos e acontecia uma transferência. Agora os dados são dela mesma”, avaliou a diretora-executiva do Ibope, Márcia Cavallari Nunes.
Houve mudanças sutis, mas significativas, na política externa. Dilma repudiou abertamente as violações de direitos humanos pelo governo de Mahmoud Ahmadinejad, no Irã. Anteriormente, Lula havia se posicionado a favor do presidente iraniano e do desenvolvimento de seu programa nuclear, posição que gerou desgaste na relação com os Estados Unidos.
De acordo com analistas, os primeiros cem dias de governo também foram marcados por investimentos no diálogo com EUA e China. O presidente americano, Barack Obama, veio ao Brasil com a esposa, Michelle, e suas duas filhas, Sasha e Malia. Durante a visita, Obama expressou vontade de “trabalhar ao lado do Brasil como parceiros iguais”.
Durante os cem dias, o real bateu recorde de valorização em relação ao dólar. Cálculos com base na taxa real de câmbio mostraram que o poder de compra da moeda brasileira havia praticamente dobrado em relação ao verificado em julho de 1994, início do Plano Real.