Risco político encolhe o chão em torno do governo Jair Bolsonaro
A terça-feira (7) tratou de exemplificar, em uma sucessão de fatos apenas aparentemente desconexos, o tamanho da encalacrada em que está o governo de Jair Bolsonaro nos seus meros quatro meses de existência.
O presidente começou e acabou o dia fazendo o que melhor sabe, alimentar a voragem das insondáveis e pouco sociais redes dedicadas a apoiar o bolsonarismo. Faz o possível o mandatário, em sua lógica: aos poucos ele parece refluir para dentro do trampolim que o lançou a um eleitorado maior em 2018.
Assim, dá-lhe defender Olavo de Carvalho a aprovar flexibilizações para compra de armas e munições. O segundo caso é previsível e respaldado na votação que Bolsonaro teve, mas o primeiro conversa com sortilégios de outra ordem.
O presidente buscou humilhar os militares em seu embate com a ala, digamos, íntima do governo —filhos, os chancelados pela prole e o espantalho preferido de todos, o supracitado escritor. As cicatrizes do episódio vão demorar para fechar, se é que irão: o risco de um desembarque futuro das alas fardadas do governo é maior do que parece na superfície.
Isso leva a outro evento da terça, a admissão do Planalto de que sim, será possível recriar ministérios para agradar aos probos do Centrão. Bom, isso é basicamente rasgar um dos pilares do bolsonarismo, a ideia de não fazer política como sempre no Brasil.
O problema é que, sem isso, não há apoio no Congresso. Sem ele, nada do Graal da reforma da Previdência —que, se de fato é vital para o país, perdeu o brilho de panaceia para a crise econômica. O que agentes financeiros vendiam como certeza áurea desde que abraçaram a candidatura Bolsonaro não parece que irá acontecer: o tsunami de dólares para investimentos no país se e quando o texto for aprovado.
O motivo? Risco político. Quem investe em um país com tal grau de desorganização administrativa, que um dia acorda privatista e noutro, dorme intervencionista? Some-se a isso a descoberta que os ministros fizeram da palavra contingenciamento: cortes provisórios daquilo que se pode cortar (na Defesa, a previsão é tosar 44% do já exíguo orçamento de custeio e investimentos, mas R$ 81 bilhões dos R$ 104 bilhões da pasta são intocáveis, vão para pessoal).
Quando isso se refletir em mais perda de qualidade de serviços públicos, boa sorte para a popularidade já decaída de Bolsonaro. Com o dólar indócil pela confusão aqui e as incertezas lá fora, nível de investimento pífio, risco de recessão e desalento com a realidade, bom, sabemos o roteiro do filme.
E aí não haverá apoio no Judiciário, sempre a um cabo e um soldado de ser espezinhado verbalmente. O Congresso fará o que sabe, procurar sangue na água e desculpas para morder. E os militares, esteio de Bolsonaro, podem bater asas se continuarem subordinados a caprichos.
Restará então ao presidente a ala olavista e sua ideia de destruição do establishment. Haverá escombros, não há dúvida, faltando saber exatamente de qual edifício. O tempo corre para a reversão do quadro pelo governo, várias coisas podem acabar dando certo. Mas niilismo nunca foi bom conselheiro, ainda mais tão cedo no jogo.