Sabotado pela timidez e depressão em vida, Nick Drake ganha homenagem
O cantor e compositor britânico Nick Drake faria 70 anos em 2018. Ao morrer em 1974, aos 26 anos, de overdose de antidepressivos, deixou três álbuns de pouco sucesso quando lançados, mas hoje reconhecidos como fundamentais na música folk. Esse legado ganha celebração nesta quarta (14) e quinta (15), em São Paulo.
Dois shows no Sesc 24 de Maio fazem parte de um projeto criado pelo jornalista Eduardo Lemos, chamado Nick Drake - Lua Rosa. “Pink Moon” é o nome do terceiro álbum do cantor, lançado em 1972. Antes, ele gravou “Five Leaves Left” (1969) e “Bryter Layter” (1970).
Canções dos três discos serão executadas por um grupo montado pelo músico e produtor Régis Damasceno, da banda Cidadão Instigado. “Vamos gravar em vídeo e áudio. Vai para o YouTube, claro. Lançar de outra forma, talvez em DVD, ainda não sabemos”, diz Lemos à Folha. “Primeiro vamos ver se vai ficar bom”, brinca Damasceno.
Reunir músicos e cantores não foi fácil, porque Drake não é muito conhecido no Brasil. Na verdade, até os anos 1990 ele não era popular na Inglaterra. Sua carreira foi sabotada por sua timidez, que o levava à depressão e impedia qualquer iniciativa para promover seu trabalho, inclusive entrevistas. A imagem dele nesta página é de 1967, registrada por seu amigo Julian Lloyd, o único fotógrafo que tinha intimidade com ele.
Mais de 20 anos depois de sua morte, Drake chegou a novas gerações de fãs pela enorme quantidade de artistas que passaram a citá-lo como referência. Entre eles, Michael Stipe, Dave Grohl e Beck.
Suas letras, belíssimas, eram encaixadas em canções folk que poderiam soar simples, mas eram construídas em cima de músicas extremante complexas. Joe Boyd, 76, lenda dos estúdios que trabalhou com Pink Floyd, Nico e R.E.M., produziu os dois primeiros álbuns de Drake e recorre a uma comparação com a bossa nova para explicar o som do cantor inglês a quem nunca o ouviu.
“Eu o compararia a João Gilberto, com intrincados trabalhos de violão soltos dos padrões vocais, canto muito suave, palavras poéticas inteligentes. Drake é hoje uma grande influência, depois de ter sido ignorado no início da carreira. Foi totalmente original, e é por isso que o público demorou tanto a aceitá-lo.”
“Eu imaginei que a gente poderia tocar as músicas de uma maneira livre, improvisando”, conta Damasceno. “Não queria uma reprodução literal do original, tipo banda cover dos Beatles de peruquinha. E não queria fazer nesse clima soturno e pesado que se associa à música do Nick Drake. Eu vejo muita beleza na música dele, uma beleza violenta.”
Os músicos que sobem ao palco, além de Damasceno no violão, são Bruno Serroni (cello e piano), Meno del Picchia (baixo), Richard Ribeiro (bateria), Thomas Rohrer (rabeca e viola) e Chris Mack (violão).
No primeiro show, Gui Amabis e Ceumar vão cantar. “Gui é uma voz grave, mais soturna. Ceumar é uma exímia violonista, e muito brasileira na música que faz. Eu jamais diria que ela era fã do Nick Drake”, conta Damasceno.
No segundo dia, Filipe Catto empresta sua voz aguda ao repertório, ao lado de Stella Campos. Fã confessa de Drake, ela vai trabalhar com uma pegada mais pop.
Filipe Catto diz que conheceu o cantor inglês nos anos 2000. “Nick Drake tem um ineditismo para o público que me interessa. As letras são muito forte e ganham, no universo instrumental minimalista dele, uma contundência bem forte. São muito dramáticas.”
Eduardo Lemos ressalta o papel de Renato Russo, que gravou “Clothes of Sand” em seu álbum solo de 1994, “The Stonewall Celebration Concert”. “É bom lembrar sempre que o Renato foi o primeiro cara no Brasil a gravar Nick Drake.”
O projeto inclui nesta quinta, às 13h, um encontro de Damasceno e Lemos com o público, também no Sesc. Eles vão usar histórias e curiosidades da vida de Drake como ganchos para que o público realize experiências práticas de afinação de violão inspiradas nas músicas do cantor.
Nick Drake - Lua Rosa
Sesc 24 de Maio, r. 24 de Maio, 109, tel. (11) 3350-6300. Quarta (14), às 21h, e quinta (15), às 18h. De R$ 9 a R$ 30