Tradicional tinta azul antifraude é símbolo das eleições na Índia
A complexa logística para preparar a maior eleição do mundo, que começa nesta quinta-feira (11), na Índia, envolve a divisão da votação em sete etapas, o uso de 1,6 milhão de urnas eletrônicas e uma antiga estratégia antifraude que já se tornou um símbolo do processo democrático no país: a tinta azul aplicada no dedo indicador de todos os eleitores.
Usada desde 1962, a chamada “tinta indelével” (que não pode ser apagada) é feita para durar semanas, até a unha crescer. Sua fórmula secreta é conhecida por apenas dois químicos, segundo a direção da empresa governamental que a fabrica sob um forte esquema de segurança, a Mysore Paints & Varnish.
Até hoje, a tinta já foi usada em mais de 4,5 bilhões de pessoas na Índia e em outros países para onde é exportada.
Na eleição deste ano, 900 milhões de pessoas estão aptas a votar e eleger 543 candidatos da Lok Sabha, a câmara baixa do Parlamento indiano. A votação vai até o dia 19 de maio e o resultado está previsto para sair no dia 23.
Nos mais de 50 anos de uso da tinta inapagável, a empresa fez poucas mudanças: uma delas foi substituir os frascos de vidro pelos de plástico para evitar problemas com quebras.
Também foi criada uma caneta que tornaria a aplicação mais rápida que o método atual, feito com pincel, que ainda está em fase de testes.
Mas a maior inovação que o governo queria implementar no processo eleitoral deste ano está estagnada por uma decisão da Justiça.
Após o último pleito geral, em 2014, o governo propôs integrar o cadastro dos eleitores ao Aaadhaar, o sistema biométrico de identidade do país.
Criado em 2009, trata-se de um número formado por 12 dígitos que é relacionado às impressões digitais e ao scanner da face e da íris de cada cidadão. É o maior sistema do tipo do mundo, parte de um esforço ambicioso para digitalizar a economia indiana.
O cartão com esse número único é usado pelos indianos para receber benefícios sociais, especialmente em um programa que garante preços mais baratos de produtos básicos.
O sistema foi digitalizado, segundo o governo, para diminuir prejuízos da ordem de US$ 23,6 bilhões (cerca de R$ 90 bilhões) com fraudes no programa. Mas críticos afirmam que o processo digitalizado viola o direito à privacidade dos cidadãos e que falhas no cadastro têm deixado várias pessoas desassistidas.
Para o governo, implantar o Aaadhaar na eleição seria a melhor forma de evitar registros duplicados e falsificações.
A mudança viabilizaria também planos futuros de estabelecer um sistema de votação eletrônica e pela internet.
Em março de 2015, foi lançado o chamado programa de “purificação” dos registros eleitorais, com uma campanha para que eleitores cadastrassem voluntariamente seus carnês de votação no Aaadhaar —380 milhões se registraram em apenas três meses.
Em agosto do mesmo ano, porém, uma decisão da Suprema Corte ordenou a paralisação do processo. Houve questionamentos em relação ao respeito à privacidade e também ao caráter voluntário do cadastro.
Também foi revelado que um software ligado ao Aaadhaar, que tem a função de deletar registros duplicados, apagou das listas de votação o nome de milhares de indianos que estão em situação regular.
O caso se notabilizou nas eleições regionais de 2018, após um tuíte da jogadora indiana de badminton Jwala Gutta dizendo que não encontrou seu nome na lista de votação seu estado. Vários eleitores se queixaram do mesmo problema.
Em setembro de 2018, a Suprema Corte decidiu que o Aaadhaar deve ser usado, por enquanto, apenas para os programas de transferência de renda, e não para fins eleitorais. Também proibiu que bancos e outras empresas privadas se liguem ao sistema, algo que vinha ocorrendo nos últimos tempos.
Mas o governo não desistiu. A imprensa indiana noticiou no fim do ano passado que a comissão eleitoral pretende propor emendas na lei que regulamenta as eleições, de 1951, para garantir que o Aaadhaar possa ser utilizado no cadastro de votantes.
Eleito em 2014 com uma plataforma que une nacionalismo hindu e modernização econômica, o BJP (Bharatiya Janata Party, ou Partido do Povo Indiano), do atual primeiro-ministro, Narendra Modi, é favorito para vencer neste ano.
O Congresso, partido de oposição liderado por Rahul Gandhi, herdeiro da dinastia Nehru-Gandhi (sem ligação com Mahatma Gandhi), tem poucas chances, segundo analistas.
Cronologia política
1947 Independência do Reino Unido
1948 Guerra com Paquistão pelo território da Caxemira; Gandhi é assassinado
1952 Primeira eleição geral; Jawaharlal Nehru vence
1962 Índia perde guerra na fronteira contra a China
1966 Indira Gandhi, filha de Nehru, se torna primeira-ministra
1965 e 1971 Segunda e terceira guerras contra o Paquistão
1984 Indira é assassinada; seu filho, Rajiv, assume
1991 Rajiv Gandhi é morto
1996 Partido BJP derrota o partido do Congresso
2007 Pratibha Patil é a 1ª mulher eleita presidente
2014 BJP vence eleição; Narendra Modi vira premiê