Vitória de presidente é certa na África do Sul, mas reformas dependem de margem convincente
Um novo termo vem sendo usado por analistas na campanha eleitoral sul-africana: Ramaphoria, ou seja, a euforia com o presidente Cyril Ramaphosa.
Após uma década de crise econômica e corrupção, o Congresso Nacional Africano (CNA), partido dominante na política da África do Sul desde o fim do apartheid, recuperou parte da reputação que perdeu durante o desastroso governo de Jacob Zuma (2009-18).
Ramaphosa assumiu a Presidência em fevereiro do ano passado, após o CNA ter finalmente se cansado do populismo e dos escândalos em série de Zuma e forçado sua renúncia.
Comparado a seu antecessor, o atual presidente é visto como um reformista. Contribui muito para sua imagem majoritariamente positiva o fato de ele ter sido braço direito do venerado Nelson Mandela no processo de transição para a democracia, nos anos 1990.
Aliados não se cansam de espalhar que Ramaphosa era o preferido do ícone morto em 2013 para sucedê-lo quando deixou a Presidência, em 1999 (embora não exista nenhuma declaração de Mandela nesse sentido).
O desgaste do CNA, há 25 anos ininterruptos no poder, provavelmente pesará no resultado final. O partido jamais teve menos de 62% dos votos em eleições passadas, e algumas projeções para o pleito que ocorre nesta quarta-feira (8) indicam que essa fatia pode recuar para cerca de 55%.
Na província de Gauteng, centro econômico e político do país, onde estão a principal cidade, Johannesburgo, e a capital, Pretoria, a margem pode ficar abaixo de 50%, o que seria importante do ponto de vista simbólico.
Além disso, a oposição nunca pareceu tão forte. A Aliança Democrática, com o carismático líder Mmusi Maimane à frente, deve ser a opção de grande parte da classe média negra e da minoria branca (cerca de 10% do eleitorado).
É um partido que tem uma imagem de moderação, limpeza e eficiência, sobretudo na região de Cidade do Cabo, que governa.
À esquerda, uma grande novidade se apresenta. Julius Malema, dissidente do CNA e líder de um partido que defende a nacionalização da indústria mineradora e a expropriação de propriedades rurais para reforma agrária sem compensação, pode chegar a 15%. Na eleição passada, a primeira que disputou, teve surpreendentes 6%.
Barulhento e com grande poder de mobilização entre jovens desiludidos com a falta de oportunidades de trabalho, Malema certamente teria poder para dificultar as reformas econômicas que Ramaphosa promete.
O país tem 25% de desempregados e estatais notoriamente ineficientes, sobretudo a Eskom, gigante do setor elétrico, que não consegue evitar apagões periódicos.
Ramaphosa promete desregulamentação, flexibilização das leis trabalhistas e um melhor ambiente de negócios. Também tem colocado o combate à corrupção, inclusive em seu partido, na lista de prioridades.
Por isso, é de se esperar que os mercados reajam bem a uma eventual vitória convincente do presidente. O fato de ter passado um período no setor privado contribui para sua imagem de figura relativamente liberal num partido que não exorcizou totalmente seu passado marxista-leninista.
Apesar do desgaste, o CNA tem força. É o partido de Mandela e da luta pela liberdade, além de ter realizações a mostrar em áreas como habitação, transportes e combate à criminalidade (que já foi bem mais alta).
Com uma máquina política estruturada em todo o país, sobretudo nas áreas mais pobres, demorará algumas eleições para se ver seriamente ameaçado.
Se não há dúvida de que Ramaphosa vencerá, a questão a saber é com que força política ele sairá da eleição.
Uma vitória magra poderá ser vista como mais uma oportunidade perdida de o país fazer reformas que alavanquem o crescimento, há anos patinando abaixo de 2% ao ano.
O presidente teria menos poder para unificar seu partido, notório pelas divisões internas, em torno de seu projeto de governo.
Ramaphoria, em resumo, pode se tornar rapidamente uma depressão.